A Igreja e o Uso do Óleo

05-10-2019 16:34
É um costume de muitas igrejas de linha pentecostal e neopentecostal o uso do óleo para consagração de objetos, pessoas (a cargos e funções ministeriais) e para ungir enfermos. Com base nesse assunto quero aqui postar, à luz das Sagradas Escrituras, um pequeno estudo que acredito ser útil para aqueles que tem dificuldades em compreender essa questão. Vou dividir esse post em algumas seções para melhor entendimento:
 
1- O Surgimento do Uso do Óleo e Suas Restrições
 
2- Significado do Uso do Óleo
 
3- Uso do Óleo na Igreja
 
4- Entendendo Tiago 5:14
 
1- O Surgimento do Uso do Óleo e Suas Restrições
 
"Falou mais o Senhor a Moisés, dizendo: Tu, pois, toma para ti das principais especiarias, da mais pura mirra quinhentos siclos, e de canela aromática a metade, a saber, duzentos e cinqüenta siclos, e de cálamo aromático duzentos e cinqüenta siclos, e de cássia quinhentos siclos, segundo o siclo do santuário, e de azeite de oliveiras um him. E disto farás o azeite da santa unção, o perfume composto segundo a obra do perfumista: este será o azeite da santa unção. E com ele ungirás a tenda da congregação, e a arca do testemunho, e a mesa com todos os seus utensílios, e o candelabro com os seus utensílios, e o altar do incenso. E o altar do holocausto com todos os seus utensílios, e a pia com a sua base. Assim santificarás estas coisas, para que sejam santíssimas; tudo o que tocar nelas será santo. Também ungirás a Arão e seus filhos, e os santificarás para me administrarem o sacerdócio. E falarás aos filhos de Israel, dizendo: Este me será o azeite da santa unção nas vossas gerações. Não se ungirá com ele a carne do homem, nem fareis outro de semelhante composição; santo é, e será santo para vós. O homem que compuser um perfume como este, ou dele puser sobre um estranho, será extirpado do seu povo." Êxodo 30:22-33.
 
O texto bíblico acima é nossa referência para a criação do óleo (ou azeite) da santa unção. Ele possuía características únicas em sua composição e também em sua utilização. Deus estava, nesse momento, estabelecendo as diretrizes para o culto, estabelecendo regras que deveriam ser seguidas pelo povo que acabara de libertar da escravidão no Egito. Nesse texto fica claro que:
 
a) Era um azeite especial, ditado por Deus a Moisés com relação ao modo de preparo;
 
b) Tinha um propósito especial: unção dos objetos sagrados, da tenda da congregação, da arca do testemunho e de Arão com seus filhos, que foram escolhidos para serem sacerdotes;
 
c) Possuía restrição total a outro uso: "Não se ungirá com ele a carne do homem, nem fareis outro de semelhante composição; santo é, e será santo para vós. O homem que compuser um perfume como este, ou dele puser sobre um estranho, será extirpado do seu povo." Êxodo 30:32-33.
 
Esse óleo não podia, de maneira nenhuma, segundo a Lei dada, ser usado para ungir outros homens, nem objetos quaisquer dos homens. A punição para desobediência era "ser extirpado do seu povo". Não temos nenhuma base bíblica, nem do Antigo Testamento, nem no Novo Testamento, para ungirmos objetos, como casas, carros, roupas, carteiras de trabalho, etc. Na história da Igreja também não vemos esse uso. Ou seja, essa prática surgiu recentemente sem qualquer embasamento na Palavra de Deus.
 
2- Significado do Uso do Óleo
 
Vemos no Antigo Testamento que o óleo era usado para ungir três classes de pessoas:
 
a) Sacerdotes: "Também ungirás a Arão e seus filhos, e os santificarás para me administrarem o sacerdócio." Êxodo 30:30;
 
b) Reis: "Então Samuel tomou o chifre do azeite, e ungiu-o no meio de seus irmãos; e desde aquele dia em diante o Espírito do Senhor se apoderou de Davi; então Samuel se levantou, e voltou a Ramá." 1 Samuel 16:13;
 
c) Profetas: "e também a Eliseu, filho de Safate de Abel-Meolá, ungirás profeta em teu lugar." 1 Reis 19:16b.
 
Tudo isso possuía um significado. Nunca devemos esquecer que toda a Bíblia, de Gênesis a Apocalipse, apontam para um único ponto: Jesus Cristo! As unções estabelecidas no Antigo Testamento apontavam para os três ofícios de Cristo:
 
a) Jesus Cristo é Profeta: "O Senhor teu Deus te levantará um profeta do meio de ti, de teus irmãos, como eu; a ele ouvireis" Deuteronômio 18:15;
 
b) Jesus Cristo é Rei: "Disse-lhe, então, o anjo: Maria, não temas, porque achaste graça diante de Deus. E eis que em teu ventre conceberás e darás à luz um filho, e pôr-lhe-ás o nome de Jesus. Este será grande, e será chamado filho do Altíssimo; e o Senhor Deus lhe dará o trono de Davi, seu pai; e reinará eternamente na casa de Jacó, e o seu reino não terá fim." Lucas 1:30-33;
 
c) Jesus Cristo é Sacerdote: "De tanto melhor aliança Jesus foi feito fiador. E, na verdade, aqueles foram feitos sacerdotes em grande número, porque pela morte foram impedidos de permanecer, mas este, porque permanece eternamente, tem um sacerdócio perpétuo." Hebreus 7:22-24.
 
Uma vez cumpridas todas essas coisas em Cristo e vindo por meio Dele a Nova Aliança da Salvação pela Graça, temos total mudança em muitas coisas, incluindo no uso do óleo.
 
3- Uso do Óleo na Igreja
 
Cumpridas todas essas coisas em Cristo não vemos mais o uso do óleo para consagração de homens a ofícios estabelecidos por Deus. Agora o que temos é imposição de mãos:
 
- "E este parecer contentou a toda a multidão, e elegeram Estêvão, homem cheio de fé e do Espírito Santo, e Filipe, e Prócoro, e Nicanor, e Timão, e Parmenas e Nicolau, prosélito de Antioquia; e os apresentaram ante os apóstolos, e estes, orando, lhes impuseram as mãos." Atos 6:5,6;
 
- "Não desprezes o dom que há em ti, o qual te foi dado por profecia, com a imposição das mãos do presbitério." 1 Timóteo 4:14;
 
- "E, servindo eles ao Senhor, e jejuando, disse o Espírito Santo: Apartai-me a Barnabé e a Saulo para a obra a que os tenho chamado. Então, jejuando e orando, e pondo sobre eles as mãos, os despediram." Atos 13:2,3;
 
- "A ninguém imponhas precipitadamente as mãos, nem participes dos pecados alheios; conserva-te a ti mesmo puro." 1 Timóteo 5:22.
 
Não existe no Novo Testamento qualquer ordem ou mesmo ensino sobre usar óleo para consagrar homens ou objetos para o serviço de Deus. Não há qualquer paralelo na história da Igreja protestante sobre isso. Como dito anteriormente essa prática tem origem recente, sem base bíblica ou qualquer apoio histórico.
 
4- Entendendo Tiago 5:14
 
"Está alguém entre vós doente? Chame os presbíteros da igreja, e orem sobre ele, ungindo-o com azeite em nome do Senhor" Tiago 5:14
 
É comum que os defensores do uso do óleo na Igreja citem o versículo de Tiago para embasar suas doutrinas acerca do tema. Também usam passagens similares dos feitos dos discípulos quando foram enviados por Jesus a pregar: "E, saindo eles, pregavam que se arrependessem. E expulsavam muitos demônios, e ungiam muitos enfermos com óleo, e os curavam." Marcos 6:12,13.
 
Para analisarmos essas passagens, que aparentemente incentivam o uso do óleo, devemos primeiramente entender que existem, basicamente, duas palavras em grego para ungir no Novo Testamento:
 
a) aleipho: ungir. Sentido: unção comum, sem propósito sagrado. Sentido medicamentoso ou festivo. Também podia se referir a unção de mortos que era comum na época bíblica.
 
b) chrio: ungir. Sentido: unção sagrada.
 
Quando lemos o texto de Marcos 6:13, por exemplo, vemos que o termo grego para ungir é aleiphon, cuja raiz é aleipho, ou seja, não é unção sagrada (do contrário seria usado chrio), mas unção no sentido comum, talvez medicamentoso (sabemos que o óleo era usado para amolecer feridas e ajudar na cicatrização). O mesmo termo é usado na passagem de Tiago (aleipsantes - raiz aleipho - unção comum).
 
Contudo, uma explicação assim ficaria meio vaga, não é mesmo? Por exemplo, o texto em Tiago não se resume a dizer: vocês devem ungir com óleo os que estão com feridas, mas evidentemente diz "Está alguém entre vós doente? Chame os presbíteros da igreja, e orem sobre ele, ungindo-o com azeite em nome do Senhor", sem especificar tipos de doenças para tal unção. Então, como entender o versículo e também os outros que falam da unção de enfermos?
 
Devemos nos ater a dois fatos ligados ao uso do óleo no Novo Testamento: ele era um remédio conhecido para feridas e também era um símbolo. A Bíblia usa símbolos a todo momento e, nesse caso, não é diferente. A unção com óleo, no caso de feridas, era medicamentoso, mas nas demais doenças (interiores, físicas ou espirituais) possuíam um significado simbólico. Se não fosse assim, porque a ordem de Tiago é que os presbíteros unjam? Se fosse apenas um remédio qualquer um poderia aplicar o óleo e depois os presbíteros orariam... A melhor explicação para essa e outras passagens (como a de Marcos) é que os discípulos e o próprio Tiago estavam usando um símbolo na unção de doentes. Percebam a continuidade do texto em Tiago: 
 
"Está alguém entre vós doente? Chame os presbíteros da igreja, e orem sobre ele, ungindo-o com azeite em nome do Senhor; e a oração da fé salvará o doente, e o Senhor o levantará; e, se houver cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados." Tiago 5:14,15.
 
Conforme o texto, o que levanta o doente é a oração da fé no Senhor. Nenhum poder sobrenatural é atribuído ao óleo. Infelizmente é costume do ser humano atribuir poderes a símbolos, tornando-os em divindades. Por exemplo, no caso da Serpente de Bronze levantada por Moisés no deserto, a serpente era um símbolo apontando para Cristo, mas tempos depois os israelitas começaram a adorá-la, levando à sua posterior destruição pelo rei Ezequias: "Ele tirou os altos, quebrou as estátuas, deitou abaixo os bosques, e fez em pedaços a serpente de metal que Moisés fizera; porquanto até àquele dia os filhos de Israel lhe queimavam incenso, e lhe chamaram Neustã." 2 Reis 18:4. Não podemos incorrer no mesmo erro. Portanto, o óleo usado pelos discípulos, assim como na passagem de Tiago, era um símbolo da ação de Deus que pela fé (e não pelo óleo) haveria de curar os que cressem.
 
Nesse caso não temos nenhum respaldo bíblico para proibir o uso de óleo, mas também não temos nenhum respaldo para obrigar sua utilização. Os apóstolos e discípulos operaram inúmeras curas e ressurreições sem usar esse elemento, fazendo uso somente da fé e oração. Por isso, se necessário, o óleo pode ser usado, mas nem se faz obrigatório nem é exigido para a intercessão pelos enfermos. Tomemos, contudo, sempre o devido cuidado para não criar idolatria acerca do uso do óleo, pois isso seria de muito prejuízo para a Igreja, a doutrina e a verdadeira fé.
 
Que Deus os Abençoe em Nome de Jesus Cristo!